É com imensa tristeza que comunicamos o falecimento da Bibliotecária-Chefe Irene Akamine nesta manhã de terça-feira.
Há 44 anos D. Irene, como era carinhosamente chamada, iniciou suas atividades no Colégio Bandeirantes. Seu lema sempre foi trabalho, integridade e honestidade. O competente trabalho por ela realizado muito contribuiu com a história e progresso do Colégio Bandeirantes.
Deixamos nossos sentimentos e sincera homenagem aos seus familiares, amigos e admiradores.
Irene Akamine
17/05/1944 – 14/10/2014
Missa 7º dia – Dona Irene:
25 de outubro, sábado, às 15h30
Igreja Nossa Senhora da Saúde
(Rua Domingos de Moraes, 2387) próxima à estação Santa Cruz
Estacionamento: Rua Santa Cruz, 96
Homenagem à D. Irene
Dona Hemeroteca
Por Hubert Alquéres
Um belo dia dos anos 80 um aluno do Colégio Bandeirantes foi até a biblioteca e com todo respeito dirigiu-se a uma senhora de pouco mais de um metro e meio. “Bom dia”, disse o aluno, “Posso falar com Dona Hemeroteca?” Entende-se a confusão do aluno. Irene Akamine, coordenadora da biblioteca do Band, tinha traços japoneses e poucos, muitos poucos, sabiam então o significado do termo hemeroteca. Até mesmo alguns professores exclamavam: “quer dizer que aquelas caixas onde a gente organiza jornais e revistas é uma hemeroteca?”
O Band foi uma das primeiras instituições de ensino a ter uma hemeroteca, quando quase ninguém sabia que o termo significava a organização temática, sistematizada e constantemente atualizada de recortes de jornais e revistas. O projeto inovador concebido e implantado por Irene dotou o Colégio de um importante suporte para as atividades pedagógicas, fonte de consultas constantes de alunos, professores e funcionários.
A novidade criou fama, atravessou os muros do Colégio, como contou a própria Irene, em uma de suas últimas entrevistas: “por causa da hemeroteca, a Folha de S.Paulo ficou muito interessada. Achou um trabalho maravilhoso e me convidou para dar uma palestra no auditório da Folha e relatar nossa experiência para professores e bibliotecários”. O Departamento de Investigações sobre o Narcotráfico de São Paulo bebeu na mesma fonte. Foi aprender com Irene Akamine como organizar uma hemeroteca.
Impossível falar da biblioteca do Band, do seu acervo, sem se referir a essa descendente de japoneses, nascida em Juquiá, no Vale da Ribeira, em 1944. Irene Akamine veio de uma família pobre. Seus pais, lavradores, criaram quatorze filhos, com muita dureza e sacrifício. A própria Irene, quando criança ia descalça para a escola, por absoluta necessidade. Mas a força de vontade falou mais alto. Jamais deixou de estudar e após trabalhar sete anos na Villares, ingressou no Bandeirantes em abril 1970, para trabalhar na Secretaria.
Trabalhava e estudava. Quando ainda cursava história na USP, Irene foi convidada pelo engenheiro Aguiar, por Jorge Barifaldi e por José Fregonezi para reorganizar a biblioteca do Colégio. Ela tinha sido
desativada quando parte das instalações do Band foi demolida em função da construção da Avenida 23 de Maio.
Foi a escolha certa. Disciplinada e metódica era, há muito tempo, “rato de biblioteca”. Quando estudava na Escola Técnica Álvares Penteado, na Liberdade, encontrava sempre um tempinho para frequentar a biblioteca da Faculdade de Direito do Largo São Francisco. Na USP também vivia na biblioteca. Quando se formou em história, a conselho do engenheiro Aguiar, ingressou na Faculdade de Sociologia e Política de São Paulo para se formar em biblioteconomia.
Irene sentia-se uma pessoa realizada por ter disseminado entre alunos e funcionários o gosto pela leitura. Era a guardiã de um tesouro preciosíssimo, o acervo da biblioteca do Band, onde existem livros que são uma raridade, de valor inestimável. Seus olhos cintilavam de alegria quando ia até uma prateleira com obras só do Século XIX e mostrava livros de Engenharia Naval que nem na USP existem.
Irene Akamine travou uma luta incansável com a doença que finalmente a levou na madrugada deste quatorze de outubro. Tinha sessão de quimioterapia na sexta e na segunda-feira já estava lá na Biblioteca, na sua segunda casa, no meio do que ela chamava de “minha gente, minha segunda família”.
Carinhosamente era chamada de “Tia Brava” por alguns alunos. Mas todos amavam essa tia. Numa de suas internações no Samaritano o banco de sangue do hospital comunicou que seria necessário ela arrumar doadores para recompor o estoque. Irene ficou preocupada, sua família era toda idosa. Poucos dias depois, uma enfermeira lhe informou ”Olha, não precisa mais. Vieram uns alunos e ex-alunos do Band e doaram sangue para você”. Ainda temos na memória, as palavras de gratidão de Irene, em uma de suas últimas conversas:
“Olha, aquele dia eu até chorei de emoção. Eu falei: gente, eu não acredito. Aí eu falei assim: a senhora pode me dar os nomes? Não, é anônimo. Eles pediram só para avisar; eles queriam que a senhora soubesse.”
Essa foi a Dona Hemeroteca, a tia de todos nós. A guardiã da história do Bandeirantes, documentada nas prateleiras de sua biblioteca.
Hubert Alquéres foi professor de matemática e física do Bandeirantes, coordenou o departamento de Atividades Culturais e hoje é um dos diretores da escola.
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