A ocupação de prédios ociosos foi o tema proposto aos alunos na prova de 2.o bimestre em Estudos Linguísticos 2. Com base em uma coletânea de textos, nas informações sobre o tema presentes nas aulas de Geografia no bimestre e nos próprios conhecimentos, a Íris Chadi e o Matheus Rodrigues elaboraram ótimas discussões sobre a questão. A Íris, por meio dos recursos argumentativos da demonstração do raciocínio e da exemplificação, defendeu a pertinência da ocupação desses imóveis pela população desassistida das grandes cidades, positiva tanto para essas pessoas quanto para a cidade, que pode ter áreas revitalizadas. O Matheus utilizou o recurso da desconstrução do argumento alheio para desfazer o estereótipo dos ocupantes desses prédios, vistos como “marginais” e “vagabundos” pela população que desconhece a situação. Para iniciar a discussão, ele usa uma referência muito pertinente, o longa-metragem Era o Hotel Cambridge, de Eliane Caffé.
Vale muito a pena ler esses textos para refletir um pouco mais sobre o tema e para ver em funcionamento os recursos argumentativos vistos nas aulas do 2.o bimestre.
Boa leitura!
Prédios abandonados, pessoas sem lar
Íris Chadi, 3J
Desde a época da colonização, o Brasil se desenvolveu a partir da ocupação de terras que não eram de ninguém. Com isso, os brasileiros tinham como subsistir e prosperar neste país. Portanto, como se pode negar, atualmente, o direito e a necessidade de se ocuparem prédios ociosos, tendo em vista o precedente histórico desta situação?
Dentre as principais causas dessa necessidade, encontra-se, naturalmente, a desigualdade social. Por conta dela, muitos cidadãos não conseguem exercer um direito fundamental: a moradia. Além do mais, a grande quantidade de prédios ociosos no Brasil tem seus motivos. Ao longo do tempo, as áreas empresariais costumam migrar para outras regiões da cidade, levando consigo a riqueza e deixando para trás áreas abandonadas. Tal fenômeno ocorreu no centro da cidade de São Paulo, que já foi uma área de acúmulo de capital paulistano, quando a cidade começava a desenvolver sua urbanização, mas atualmente é um local de abandono e pobreza. Outras áreas, como, por exemplo, a avenida Faria Lima e a Juscelino Kubitschek, são atuais núcleos empresariais.
Deste modo, parece lógico unir dois fatores negativos que se encontram no mesmo local: pessoas sem moradia e moradias sem pessoas. Todavia, desde o desabamento do prédio ocupado no Largo do Paissandu, tem sido revivida nos brasileiros a vontade de culpar os moradores irregulares pelo incêndio. Porém, o problema não foi causado pelos moradores, mas, sim, pela situação precária em que a prefeitura paulistana deixou aquele imóvel por anos. Se aqueles moradores pudessem escolher, certamente não residiriam em um edifício tão malcuidado. Eles não tinham escolha, estavam apenas buscando seu direito à moradia.
Assim, as consequências da ocupação não são tragédias urbanas, como grandes incêndios. Essas moradias potencializam um maior desenvolvimento da região, que, com os moradores fixos, aos poucos gerará mais infraestrutura urbana em áreas que, hoje, são desorganizadas e abandonadas.
Portanto, a ocupação de imóveis ociosos é necessária e pode garantir conforto e bem-estar tanto para os que necessitam dela diretamente, quanto para a sociedade no geral, que se beneficiará da revitalização de áreas abandonadas da cidade.
Refugiados Urbanos
Matheus Rodrigues, 3E
O longa-metragem Era O Hotel Cambridge, dirigido pela Eliana Caffé, documenta uma ficção sobre a história real de várias pessoas que participam da ocupação de um prédio no centro de São Paulo. O filme retrata visceralmente as vidas individuais dos ocupantes, aproximando-os do espectador ao ponto de parecerem velhos conhecidos. Humanizam-se assim pessoas – refugiados sírios, africanos e brasileiros – que ocupam edifícios ociosos nas zonas urbanas de todo o Brasil e são vistos pela população geral — principalmente a porcentagem mais rica, que definitivamente não sofre com a falta de moradia — como vândalos.
A ocupação não se limita apenas à cidade de São Paulo atual, e sim remonta aos tempos do Brasil colonial, uma vez que os escravos negros fugidos da fazenda e sujeitos à falta de moradia se organizavam em quilombos, ocupando áreas às margens dos grandes centros urbanos. Também é possível citar os casos de ocupação nos morros do Rio de Janeiro, originando as favelas, decorrentes majoritariamente da exclusão social e falta de planejamento urbano, que datam desde o final do século XIX e perpetuam até os dias atuais.
Há quem diga que as ocupações são um crime, um problema público, já que os ocupantes “marginais” e “vagabundos” se instalam irregularmente nas propriedades alheias, degradando o espaço público, aumentando a criminalidade ou, como diriam os mais bondosos, vivendo em condições impróprias. Vale ressaltar que as pessoas da ocupação não fazem isso por opção (mentira, é isso ou elas passam a morar na rua, o que é bem pior), e sim porque elas estão privadas de um direito humano básico previsto na Constituição: o direito à moradia.
Ou seja, as ocupações são um problema público, mas não de maneira animalizada e criminosa como muitos sugerem, e sim uma questão humanitária. Deve-se levar em consideração que se trata de uma boa porcentagem das populações urbanas que vivem em situações de extrema pobreza, abandono e descaso das autoridades, precisando recorrer ao refúgio em prédios abandonados e em situações de risco para viver com um mínimo de condições humanas, dignidade e decência.
Cabe ao governo das grandes cidades prover moradias básicas para atender às demandas dessa parte da população, que carece de recursos materiais e imateriais, além de outros direitos que possam possibilitar a integração destes à sociedade, como educação, assistência médica e melhor qualidade de vida. Afinal, estamos tratando de pessoas, humanos que merecem os mesmos direitos que qualquer um.