Oi, tudo bem com você?
Comigo, não poderia estar melhor! E há um grande responsável por isso: finalmente, começou o verão! Sem sombra de dúvidas, o verão mais esperado dos meus 22 anos de vida. Enquanto no Brasil muitas vezes nem nos damos conta da mudança de estações, aqui em Boston o solstício de verão, no dia 21 de junho, foi muito comemorado. O vídeo abaixo foi gravado neste dia no Public Garden, meu lugar favorito da cidade. Festejando a nova estação, a banda tocava a música “Sweet Caroline”, um dos hinos de Boston.
Apesar de alguns dias quentes durante a primavera, ainda houve vários momentos bem gelados. Por exemplo, na semana retrasada, em torno do dia 5 de junho, a máxima foi de 8 graus. Sim, 8 graus em pleno junho. Contudo, aparentemente, agora o calor veio para ficar – ou pelo menos, é o que eu espero! Torça por mim!
O verão de Boston, porém, tem suas peculiaridades. Analogamente ao inverno, que é MUITO frio, o verão também é extremamente quente, chegando facilmente aos 35, 40 graus. Parece que a capital de Massachusetts é do tipo “tudo ou nada”! Eu obviamente não estou reclamando: prefiro com toda a certeza esse calor absurdo ao inverno gélido. Uma das melhores partes é que escurece super tarde, só depois das 9 horas da noite, então os dias são muito bem aproveitados.
Adoraria encher esse post de fotos lindas do verão de Boston, mas apesar da nova estação e do delicioso estado de espírito que tomaram conta da cidade, infelizmente não é do lado de fora que estou passando a maior parte dos dias. Como eu trabalho no laboratório, não tenho as férias oficiais de quase 4 meses (sim, tudo isso!) das quais os demais estudantes universitários de Harvard usufruem. E, conforme as pesquisas progridem, há cada vez mais afazeres.
Sobre a minha pesquisa, quero te explicar porque eu falo tão pouco sobre isso no blog, sendo que eu passo a grande maioria do meu tempo dentro do laboratório: ciência é repetição. Por mais que você descubra algo incrível, você precisa repetir aquele experimento diversas vezes, até o resultado ser consistente e poder ser publicado para a comunidade científica. Portanto, por menos empolgante que possa soar, é a verdade: meus dias, semanas e meses no laboratório de Harvard são muito parecidos. Veja bem, não é como se minha vida fosse um tédio. Estou adorando a experiência, só não quero entediar você, meu caro amigo leitor.
Então, resumidamente, do que se trata a minha pesquisa? Já falei um pouco disso no post Entre cérebros e pulmões, mas como vários meses já se passaram, obtive um avanço interessante nos resultados. Basicamente, a cada experimento, eu uso cerca de cem pedacinhos de pulmões de ratinhos para testar diferentes doses de certas substâncias. Comecei com etanol (o famoso álcool etílico). Passei muitas semanas estudando o efeito dessa substância nos pulmões, visto seu uso extremamente difundido no mundo moderno. Sei que a primeira coisa em que você pensou foi no álcool dos combustíveis e das bebidas, mas ele está presente em diversas outras coisas, de medicamentos a perfumes, e eu vou te poupar dessa longa lista.
Depois do etanol, parti para outras substâncias de nomes longos e esquisitos, daquelas que sempre aparecem nas provas de química da professora Beth Zink. Os produtos testados não são escolhidos aleatoriamente: todas essas substâncias fazem parte de uma lista elaborada pela União Europeia, que está desenvolvendo esse projeto em conjunto com a Harvard University.
Na prática, o que eu faço é banhar os mini pedacinhos de pulmões em diferentes concentrações de cada produto. Depois, analiso a vitalidade de cada pedacinho, que funciona como um pulmão inteiro. Parece tranquilo, não é mesmo? Pois bem, as aparências enganam. Um experimento desses leva o dia inteiro, das 9 da manhã às 7 da noite, e é composto por várias etapas que não detalharei. No dia seguinte, vem a parte mais importante, a análise matemática dos resultados, e então preciso montar planilhas, tabelas e gráficos. Gosto muito dessa parte, principalmente quando os resultados se mostram conforme o esperado. Essas análises são sempre acompanhadas de uma certa apreensão, já que elas ditam os próximos passos da pesquisa, que são discutidos com meus supervisores. Apesar de ser uma quantidade considerável de trabalho, há bastante flexibilidade e eu faço os meus próprios horários no laboratório, de modo que, organizando-me bem, eu tenho infinitamente mais tempo livre aqui do que eu tinha na Faculdade de Medicina ou no Band.
Eu gosto muito de todo esse processo de produção científica, mas estaria mentindo se dissesse que amo de paixão. Sinto muita falta de estar no hospital, do contato humano, do olho no olho, de rir e chorar com cada paciente, e essa saudade me faz ter ainda mais certeza da minha escolha de cursar medicina. Talvez no futuro, depois de formada, eu trabalhe tanto no hospital, atendendo pacientes, quanto no laboratório, fazendo ciência, mas tenho certeza de que não serei exclusivamente pesquisadora. Por um ano, tenho aprendido muito fazendo só pesquisa, mas por uma vida inteira, creio que me frustraria.
De qualquer modo, deixando de lado a divagação sobre o futuro e voltando ao presente ensolarado, uma coisa é certa: termino todos os dias de trabalho deitada nesse gramado, antes congelado, em frente à Harvard Medical School, sentindo o sol na pele e saboreando o simples prazer de existir. Depois de um longo inverno, é impossível haver melhor recompensa!
Até a próxima!
Carol Martines
_____________________________________________________________________________
Carolina Martines estudou no Colégio Bandeirantes de 2006 até 2012. Em 2013, foi aprovada em primeiro lugar na Escola Paulista de Medicina (UNIFESP), mas optou por cursar medicina na Universidade de São Paulo (USP). Depois de concluir os quatro primeiros anos da faculdade no Brasil, foi aprovada em um programa que a Faculdade de Medicina da USP tem com a Harvard University. Este programa seleciona estudantes que terão o privilégio de ser alunos de Harvard por um ano, trabalhando com pesquisa científica.
“A ciência serve para nos dar uma ideia de quão extensa é a nossa ignorância”. (Félicité Robert de Lamennais)