Dia desses, li uma reportagem no site Guia do Ator (http://www.guiadoator.com.br), que me chocou. A manchete já previa o choque que a notícia causaria em muitos dos leitores: “Entrevista de Caio Castro na ‘Gabi’ causa indignação na classe”. O moço, segundo a matéria, afirmou categoricamente, no programa “Marília Gabriela Entrevista”, da GNT, que não gostava de teatro e que lia apenas como obrigação. Ainda segundo a reportagem, atores fizeram declarações explícitas contra o moçoilo: Pedro Paulo Rangel, Miguel Falabella, Ingrid Guimarães.
Afeita há pouco ao facebook, postei a tal matéria, sabedora de que “causaria”: amigos atores e atrizes, cantores e cantoras, professores e professoras se chocariam tanto quanto eu, e trocaríamos palavras de solidariedade sobre os tempos pós-modernos, em que o Parecer é mais importante que o Ser, em que o conhecimento e a entrega total à Arte são artigos raros, em que a ignorância parece palavra de ordem.
E assim foi. Ou quase.
Um velho e querido amigo foi um dos primeiros a postar um Comentário: Não comungo da opinião do Caio Castro, e também não concordo com a Ingrid Guimarães. Cada um faz e leva a vida como quiser! O que é certo e o que é errado? “Tudo posso, mas nem tudo me convém”. Em seguida, outra querida: Detesto o Caio Castro e não o considero artista por n motivos. Mas não se importar com teatro e sim com televisão não é um deles.
Como é bom levar um trança-pé. Essas duas opiniões, divergentes de todas as outras dos também-amigos-queridos que postaram Comentários, me fizeram repensar alguns conceitos: seriam eles pré-conceitos? Estaria eu, tal qual “tiazinha do churras” (expressão aprendida também há pouco), doida para reclamar da vida, para me lamentar das injustiças do mundo, para criticar um assunto qualquer, para chorar publicamente – muito publicamente – no facebook?
Passado algum tempo, posso dizer, sem medo: Não.
Não sou – ainda… – tiazinha do Churras. E não vou me furtar a reclamar, lamentar, criticar, chorar.
Duas razões.
A primeira tem direta relação com a frase, dita pelo moço, “O teatro não me apetece”. Concordo plenamente com aqueles dois queridos que me surpreenderam no facebook. Realmente, cada um faz e leva a vida como quiser! E preferir a televisão ao teatro não é crime. Porém… não há como negar que o moço-da-tv não está, simplesmente, levando a vida: ele veio a público falar o que pensa. Não teve vergonha. Ouso dizer que teve até certa dose de orgulho, orgulho de “dizer o que pensa”, de “ser original”, de “ser verdadeiro”. Oras… há verdades que é melhor esconder até de si. Não estou afirmando que teatro seja melhor do que televisão. De modo algum. Se eu defendesse isso, estaria corroborando as ideias dos críticos ao talentoso ator Luís Melo, que, quando começou a atuar em novelas, teve de ouvir que ele havia “se vendido”. Se eu defendesse isso, estaria criticando a grande, grandíssima Fernanda Montenegro, que é maravilhosa no palco, na telona, na telinha. Não, de modo algum. E, se de modo algum eu apoio quem defende o Teatro Puro, como eu apoiaria quem defende a TV Pura? Ademais, o moço – tadinho, um despreparado… – não teve nem mesmo a malícia de saber que, ao falar mal do Teatro, ao afirmar que não gosta do palco, ele está mexendo com coisa séria… os Deuses do Teatro não gostam de ser desafiados nem menosprezados… E também não há como negar que o Teatro é, sim, uma Escola. Escola para se aprender a lidar com o inesperado (o “branco”, a falta de público, a sala lotada de gente, a gripe, a dor de cabeça, o celular do espectador, a falta de timing do outro ator), a trabalhar com a voz, a trabalhar com o espaço. O Teatro é uma Escola.
E a Escola é a segunda razão para meu direito de reclamar, lamentar, criticar, chorar. Quando o moço-da-tv afirmou que não gosta de ler, que lê só por obrigação, ele prestou mais um desserviço. Quantas e quantas pessoas, ao ouvir essa declaração, identificaram-se e disseram “ah, eu também! Eu sempre pensei isso, mas tinha vergonha de dizer! Ele tem razão: ler é chato!” Quantas? Esse moço não sabe que, famoso, visível, ele tem influência sobre a meninada. Uma meninada que se espelha em um modelo, visando a atingir o mesmo objetivo – no caso, ser famoso, ter uma carreira… ser VISTO.
Não tenho nada, absolutamente nada, contra esse moço-da-tv. Como eu já disse, tadinho, ele é um despreparado. Porém ainda prefiro o preparo. Ler é mais que importante. É fundamental. Ler permite o incentivo à imaginação. Permite a abertura à criatividade. Permite o acesso à informação. Permite o direito de Saber. Permite conhecer. Permite Ser Melhor.
Por isso prefiro o preparo. “A questão toda é estar preparado”, disse Hamlet, na obra do meu amigo William Shakespeare. Sim, porque William, Machadão, Carlinhos, Clarice, Fernando, Vinicius, Fiodor, Cecília, Manuel são todos meus amigos. Íntimos. E que orgulho eu tenho disso.
Professora Fabiana de Lazzari