A verdade dorme cedo, e só nascemos à noite. Seres fotofóbicos determinados a uma vida diurna que nos é impossível. Os olhos sempre doídos à luz lancinante do astro insuportável. Mentiremos sempre, seremos eternas mentiras. Quem se pretende verdadeiro? Quem pretende coerência na realidade absurda que nos exige tudo o tempo todo ao mesmo tempo? No calor, ao sol, desenrolar a verdade faz-se tamanho desconforto que fiar um sorriso minguante e desfiar palavras tediosas parece, estranhamente, mais fresco e quase suportável na sobrevida que nos acomete; febre sem delírio.
Até que o lenço mais bondoso veste o céu de luto e a vida floresce. Só se sente à noite, somos todos loucos à noite. O sorriso da lua é nascente e não mais se balbucia o tédio, mas cantam-se as dores e os amores. A sinceridade dos paradoxos rodopia em si mesma, digladiando-se junto à fumaça dos cigarros e lá se vai a mentira com elas, engolida pela escuridão implacável. Dá-nos ar para respirarmos. Dá-nos espaço vazio para sermos, para vermos e para sentirmos o que quisermos. À noite, somos. E podemos dizê-lo.
Pedro Brener (3H1)