Eu via a pilha de corpos se formando pelas ruas e uma tristeza profunda tomou conta de mim. É…era preciso ser frio. Eram meus inimigos. Aquele era o sinal da vitória. Era mesmo? Havia crianças,mães,pais,avôs, avós…Famílias inteiras deitadas no chão frio, condenadas ao sono eterno. Para quê? Eram eles os culpados? Não, com certeza não eram…Senti repulsa de mim mesmo. Senti repulsa de meus colegas e de amigos que me protegeram. A realidade me atingiu em cheio. Acordei do sonho (ou pesadelo) da guerra. Estive hipnotizado por tanto tempo…Como vim parar aqui? Como veio parar este sangue em minhas mãos? De quem seria ele? Larguei minha arma. Quis abandonar tudo. Minha vontade era sair correndo e só parar quando tudo aquilo sumisse. Mas os corpos eram muitos e só me faria piorar o espírito usá-los como tapete vermelho de minha fuga. Fiquei parado. Olhei para os lados. Desarmado e indefeso. Algum soldado gritou algo para mim. Não ouvi. Disparos e tiros. Fiquei esperando me atingir. Pelo menos tudo acabaria logo ali e eu me juntaria a pilha de pessoas que ajudei a formar. Mas absolutamente nada aconteceu. Algumas lágrimas escorreram pelo meu rosto. Por quê? Não sei se pelos corpos, pela vida que ainda me pertencia ou pela grande pátria desumana a quem servi. Ouvi mais gritos e mais tiros, porém era incapaz de me mover. Abri os braços em rendição apenas. Só queria que acabasse logo. Pensei em pegar a arma do chão e dar fim aquilo com minhas próprias mãos mas a ideia de tirar a vida de mais um ser humano me era insuportável. Restava-me esperar então. Observei os escombros da cidade que até um mês atrás existia ali. Me disseram que a vitória traria honra, mas a imagem me fazia sentir humilhado. Transformei-me em um monstro e nem percebi. Cadê as balas que não chegavam? Não sei quanto tempo fiquei ali até desistir. Só sei que por fim andei. Andei, andei. Cada passo mais consumido pela culpa. Maldita culpa. Perdi-me por lugares que antes conhecia. Deixei a fadiga tomar conta de mim. A guerra levou meus inimigos e fez questão de me levar junto…
Leila Maciel, 2H1