Por Caio Duarte, 3H2.
“Com a polarização do mundo após a Segunda Guerra, ficou evidente que a disputa entre os dois blocos se daria em todos os campos imagináveis. O Esporte, tendo a competição em sua essência, foi um instrumento de exposição das capacidades soviéticas e comunistas nessa corrida pela supremacia tecnológica.
A União Soviética e seus Estados parceiros aproveitavam as competições internacionais, como as Olimpíadas, para exibir o que seus atletas modelo conseguiam fazer. Os limites desses homens e mulheres, muitas vezes levados ao extremo, eram expandidos com anabolizantes e outros produtos químicos que o Estado lhes fazia ingerir. Célebres são os casos das ginastas soviéticas que impressionavam o mundo com suas habilidades, mas que se aposentaram por doenças causadas pela ingestão excessiva de substâncias para o doping.
Ainda que a URSS fosse a maior potência atlética do bloco, a Nação que melhor desenvolveu e aplicou um programa de doping foi a antiga Alemanha Oriental, onde os órgãos responsáveis pelos esportes selecionavam os melhores dentre os melhores para competir sob o efeito de substâncias que melhorassem a performance. Alguns acreditam que essa vantagem dos alemães fora em parte causada pela herança das indústrias químicas que a DDR herdou da antiga Alemanha, já que grande parte das indústrias e laboratórios alemães ficou do lado soviético na divisão da Alemanha Nazi. Outros acreditavam que a superioridade nos esportes advinha da antiga estrutura de treinamento de ponta dos nazistas.
Os efeitos da criação desses superatletas vermelhos são até hoje sentidos entre os alemães orientais. Um caso famoso, mas não isolado, é o de Heidi Krieger, ouro no lançamento de pesos pela equipe olímpica da DDR, que foi selecionada para participar do programa de doping e ingeriu quantidades tão altas de esteroides (10 vezes a dose que atletas costumam usar) por uma frequência tão grande que seu corpo acabou por perder a regulação de hormônios femininos e começou a transformá-la em homem. Após um cirurgia de mudança de sexo, Heidi, que já tinha adquirido aparência e feições masculinas, passou a se chamar Andreas, e hoje é um senhor calvo e com problemas de saúde por causa das altas quantidades de hormônio que foi forçada a ingerir, sem ter conhecimento do que fazia.
Com o agravamento da disputa na Guerra Fria e os boicotes às Olimpíadas, o desempenho desses atletas acabou ofuscado pela mídia ocidental e pela falta de oportunidades mundiais para que competissem, mas a herança dos grandes programas de formação de atletas ainda sobrevive nos quase-militares programas de treinamento chineses, que obtêm resultados espetaculares quando seus atletas competem internacionalmente.
O curioso de todo esse quadro é o caso cubano. Sem doping, subsídios e treinamento excessivo, Cuba continuou seguindo sua tradição no beisebol, e ainda hoje, mesmo não possuindo liga profissional, apenas com atletas da liga amadora nacional, é a maior detentora de títulos desse esporte. A Ilha dos Castro possui 36 ouros, contra 6 dos EUA, segundo colocado entre os títulos dos campeonatos que a Federação Mundial de Beisebol realiza desde 1938. Seus atletas, de origem amadora, são as estrelas predominantes na liga americana, ainda que venham de uma Cuba sem infraestrutura para seu preparo.
O legado da Guerra Fria nos esportes, mais marcado pelas partidas entre as duas Alemanhas e as duas Coreias, além do simpático ursinho Misha, da olimpíada de Moscou, pode ser definido como uma era de aperfeiçoamento de atletas como nunca antes visto, e ainda hoje não igualada em inúmeros esportes. Foram-se os tempos das ginastas romenas de nota 10 e dos alojamentos isolados, mas ainda fica a lembrança, toda vez que é tocado o hino da Rússia, de mesma melodia do da defunta URSS, e seus atletas cantam a antiga letra… ‘União (in)destrutível das Repúblicas(…) sólida base dos povos irmãos…’”