O ano passado, após uma aula sobre reforma protestante, a Letícia Evaristo, hoje na 3B1, na época na 2B1, veio falar comigo observando, com um largo sorriso, que algumas coisas que eu havia dito não correspondiam ao clavinismo verdadeiro. Já que ela é calvinista e eu obviamente não sou, pedi a ela que escrevesse um texto para este blog, a fim de esclarecer pelo menos alguns dos mal entendidos. Demorou, mas aqui está. Agradeço a ela e ao namorado, Emmanuel Carvalho, pela gentileza.
“Todos já ouviram falar do Calvinismo, uma das correntes cristãs a que a Reforma Protestante deu origem no século XVI. Como toda denominação verdadeiramente cristã, esse tem a Bíblia como base de qualquer doutrina. Contudo, na tentativa de apresentar de uma forma concisa o que Calvino pregava, muitos livros de história acabam distorcendo suas palavras, oferecendo uma visão errada sobre o calvinismo.
É comum encontrar que a miséria, para Calvino, era a fonte de todos os pecados. Esse conceito é totalmente errado, uma vez que a Bíblia diz que o pecado vem do coração do homem e todos os homens, ricos ou miseráveis, são pecadores (cf. Rm 3.23). Partindo desse conceito errado, afirma-se, equivocadamente, que um indivíduo miserável não pode ser salvo. Em primeiro lugar, a Bíblia ensina que o cristão pode passar por muitas privações e sofrimentos (Tiago 1:9). Calvino sabia muito bem disso, como podemos observar, por exemplo, no capítulo 4 do livro IV das Institutas da Religião Cristã, seções 6 e 7, em que ele trata do ofício dos diáconos e da assistência aos cristãos pobres. Em segundo lugar, a Bíblia ensina que a salvação é pela graça, isto é, pelo favor de Deus para com os homens, e não depende de coisa alguma presente no homem, senão da livre vontade de Deus (cf. Ef 2.8, Institutas, livro III, capítulo 21).
O Calvinismo é bem conhecido também pela doutrina da predestinação. Não é possível determinar se um indivíduo é predestinado (escolhido por Deus) para a salvação pela quantidade de riquezas ou comportamento dele. Se a pessoa crê e aceita verdadeiramente a Cristo, e isso muda a vida dela, ela é predestinada. O cristão deve se examinar-se pra saber se as suas atitudes, intenções e convicções mostram que ele é ou não realmente um servo de Deus.
Os livros de história também costumam relacionar o surgimento do Calvinismo com o crescimento da burguesia. Essa comparação é válida no sentido de que o Calvinismo, partindo da doutrina bíblica, considera o trabalho também como um meio de servir a Deus. Porém, isso não significa que quanto mais lucro a pessoa tiver mais ela glorificará a Deus. A glorificação de Deus pelo trabalho é por meio da sua disposição e serviço a Deus, obedecendo a Ele no trabalho e contribuindo com os necessitados. O próprio Calvino reprovava fortemente a ganância. Ele sempre defendeu que os cristãos deveriam viver uma vida simples e empregar boa parte das suas posses no amparo aos mais pobres (cf. Ef 4.28). Mas muitas pessoas tendem a distorcer o ensino de Calvino – muitos dos próprios cristãos da mesma época que Calvino já distorciam essa ideia sobre o trabalho a fim de buscar o enriquecimento usando a ‘diligência’ como pretexto para a ganância!
Depois de um olhar mais atento aos documentos originais da Reforma protestante – as fontes históricas – é possível que se obtenha uma ideia diferente a respeito do pensamento calvinista.
De qualquer forma, se alguém se interessar pelo assunto e quiser olhar, se aprofundar, leia as notas e há ainda muito material disponível na internet (ccel.org, monergismo.com, etc.). Alguns textos são bem grandes, mas vale muito a pena conhecer o pensamento cristão reformado”
Indicações
http://www.ccel.org/ccel/calvin/calcom45.vi.ii.iii.html
http://www.monergismo.com/textos/catecismos/brevecatecismo_westminster.htm
http://www.ccel.org/ccel/calvin?show=worksBy