Os mais novos transgridem mesmo: quando o processo de educação acontece, há sempre resistência
Rosely Sayão | FOLHA DE S. PAULO | Equilíbrio | 09/08/2011
Mães e pais andam espantados e/ou perplexos com a desobediência de filhos pequenos, maiores e até mesmo adolescentes. Que coisa, não? Por que será que esses pirralhos não entendem que precisam acatar o que seus pais lhes dizem?
Uma leitora conta que é uma mãe dedicada e consciente de que o seu maior compromisso na vida, hoje, é o de educar bem a filha, que tem cinco anos. Diz inclusive que, regularmente, assiste a palestras e lê coisas de qualidade a respeito do assunto.
O problema, segundo ela, é que mesmo assim se defronta com as birras que a filha faz, com manhas na hora de colocar a roupa ou comer e com pequenos escândalos – quando a garota quer ter ou fazer uma coisa que a mãe entende que não deve dar ou permitir naquele momento.
“Qual o meu erro?”, me pergunta essa responsável mãe. Certamente, muitos outros pais passam pela mesma situação e se fazem essa mesma pergunta.
Um pai, agora um tanto quanto desconsolado e assustado, enfrenta a adolescência do filho. O jovem quer sair sem hora para voltar e sem dar explicações. Além disso, o garoto sempre transgride as poucas regras que o pai tenta lhe impor.
Depois de dizer que sempre educou o filho de um modo democrático, esse pai confessa não saber o que fazer. “Será que vou ter de castigar meu filho, agora que ele cresceu?”, pergunta. Pelo menos ele não desistiu, como muitos pais de adolescentes têm feito… Qual é a questão, afinal? Por que os mais novos insistem na transgressão?
Será responsabilidade desse mundo tão transformado, da crise de valores, das escolas, das más companhias, das “famílias desestruturadas”, como muita gente gosta de afirmar?
Ou será que as crianças de hoje já nascem diferentes, mais ousadas e com “personalidade forte”? Ou, ainda, será que os pais já não sabem mais agir com autoridade?
Não, caro leitor, a questão é bem mais simples. Então, de largada vamos lembrar de um princípio básico: sempre que a educação acontece, há resistência ao processo.
Pronto: é simples assim. A relação da mãe e do pai com os filhos é sempre um pouco tensa. Por quê?
Porque os pais precisam introduzir o filho na dinâmica familiar, na convivência com os outros, na vida que a cada dia apresenta um pouco mais de desafios e, portanto, compromissos e responsabilidades, entre outras coisas. Ora, isso significa impor à criança uma determinada direção.
Comer determinados alimentos desta ou daquela maneira, tomar banho, vestir esta ou aquela roupa, ir para a escola, não comer em determinados horários, prestar contas aos pais, respeitar pessoas etc. etc. Por que a criança deveria aceitar isso de bom grado se o que ela quer é bem diferente?
Ela quer ficar vendo televisão, jogando videogame ou futebol, dormindo pela manhã ou acordada de madrugada e se colocar no centro do mundo… Isso é o que ela quer. O jovem quer se grudar ao grupo, ser plenamente aceito por seus pares, quer diversão sem fim… A juventude é curta, afinal.
Só isso já seria suficiente para nos fazer reconhecer que eles irão reclamar, resistir, usar todas as estratégias que têm à mão para demonstrar seu descontentamento. É só isso o que expressa a desobediência e a transgressão. Faz parte do jogo, não é verdade?
Mesmo tendo aprendido, eles irão insistir na transgressão. Não é assim no futebol, por exemplo? Por isso o jogo exige árbitros e penalidades para as faltas.
Então, vamos relaxar: os mais novos sempre irão transgredir, desobedecer. É um direito deles. É dever dos pais persistir com o processo educativo em curso, reafirmar posições, fazer valer o ensinado. E ter paciência.
Até quando essa situação persiste? Até a maturidade dos filhos, que deve chegar por volta dos 20 anos, se tivermos um pouco de sorte além do empenho investido.
ROSELY SAYÃO é psicóloga e autora de “Como Educar Meu Filho?” (Publifolha)