Let It Come

Publicado em 21/02/14

elsa

É tão triste quanto frequente, ao se discutir animação no cinema, ouvir afirmações do tipo “Ah, é legal, mas é filme de criança” ou “Não é filme, é desenho”, e fica claro que há um erro conceitual em questão. Animação não é gênero. Animação é forma. Um filme animado, é importante ressaltar, foi assim concebido por uma opção de linguagem, que pode tanto ter se dado levando em conta o seu principal público-alvo como por simples decisão artística, entre diversos outros motivos. Como forma, a animação (tradicional ou computadorizada) pode servir ao filme visual ou narrativamente; pode aparecer em qualquer gênero, da comédia pastelão ao melodrama.

Torna-se importante, pelo que foi exposto acima, encontrar filmes como Frozen que, apesar de serem claramente direcionados, no plano comercial, ao público infantil, funciona perfeitamente como bom cinema para qualquer plateia. A trama é simples: a partir de um acidente envolvendo seus poderes na infância, a princesa Elsa se vê obrigada a se isolar de tudo e de todos, inclusive de sua irmã Anna, de quem era muito próxima. Um acontecimento no dia de sua coroação, porém, expõe suas habilidades incomuns ao reino, e Elsa é obrigada a se isolar pela segunda vez – só que, agora, seu isolamento é ainda mais significativo.

As qualidades técnicas do longa são indiscutíveis, e a Disney Animation prova mais uma vez, após os ótimos Enrolados e Detona Ralph, que pouco deve à Pixar nesse quesito. O que pode se renovar em Frozen, porém, e merecidamente, é a fé do público da Disney na força dos musicais animados do estúdio. Se, em menor escala, A princesa e o sapo – que se revelava um todo maior que a soma de suas partes no que diz respeito às canções – e o já citado Enrolados – no qual a única faixa de sua trilha que parecia realmente sobreviver após a sessão era a bela “I See the Light” – vieram para reacender expectativas, é aqui que a Disney entrega um filme que, se não alcança, chega muito perto de alcançar jovens clássicos como O Rei Leão e A Bela e a Fera em termos musicais. A contratação do casal Robert Lopez e Kristen Anderson-Lopez para escrever temas para a produção revela-se então acertadíssima, visto que a grande maioria de suas composições funcionam independentemente ao mesmo tempo em que contribuem para o avanço da narrativa – de “For the First Time in Forever”, que contrapõe perfeitamente a carência afetiva de Anna ao medo que Elsa sente de se aproximar de outras pessoas, a “Let It Go”, que transmite de forma concisa tudo o que é preciso para o entendimento da transformação interior da irmã mais velha. Aqui ainda vale destacar os talentos vocais de Kristen Bell (Anna) e, principalmente, Idina Menzel (Elsa).

É muito bom constatar a eficiência de Frozen no cumprimento de sua proposta, que consiste em contar uma história calcada nos clichês estabelecidos pelo próprio estúdio (Disney) e subvertê-los sempre que possível. Vários exemplos consistem em spoilers, mas o maior deles, que permeia toda a projeção e tem seu ponto alto no clímax, é também o mais relevante: o foco. Primeiro, é preciso lembrar que Jennifer Lee, co-diretora (ao lado de Chris Buck) e roteirista do projeto, é a primeira mulher a dirigir uma animação produzida pelos Walt Disney Animation Studios. E então vale a pena se perguntar qual foi a última vez que se viu uma animação tendo princesa(s) como protagonista(s), nos moldes clássicos, na qual ela(s) não dependesse(m) de um personagem masculino com papel crucial na resolução de seu conflito – o Príncipe por excelência. Ou então na qual a história não enaltecesse o amor romântico como passo crucial para a felicidade. E é aqui que Frozen se revela mais inovador, delicado e, surpreendentemente, feminista. Sem fugir à fórmula clássica de história de princesa totalmente, o filme reitera que o amor é fundamental para o alcance da felicidade completa, mas abre o leque de possibilidades enfocando um amor fraternal no lugar do típico romântico. Um é tão válido, puro e belo quanto o outro. Também se destaca a independência das personagens femininas, especialmente de Elsa – embora conte com o apoio fundamental de sua irmã em sua jornada de auto-aceitação, a personagem revela-se perfeitamente capaz de lidar com seus próprios problemas, sem precisar ser salva por um príncipe encantado que venha em um cavalo branco. Aí, sim, reside a importância desse filme, que inevitavelmente fará parte da infância de muitas crianças. Não é algo desse tipo que queremos que nossos possíveis futuros filhos, e filhas, em especial, assistam?

José Henrique Ballini Luiz, 2H1

 

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